A NOSSA HISTÓRIA

As cidades costeiras são fenómenos emergentes de interações dinâmicas à escala local entre forças socioeconómicas, culturais e biofísicas. O movimento de grupos culturais marginais na área urbana costeira apareceu como uma resposta topológica ao movimento de conurbação durante a Idade Industrial. Hoje em dia, esse movimento tem crescido exponencialmente, não só diante dos choques sociais mundiais, mas também diante da atual crise económica e do movimento de pessoas em contínua deslocação, tendo sido chamado de re-alocação do corpo humano,  o qual caracteriza nossa atual era de migração (Fouberg et al., 2012).

Este processo cria delimitações (eg., culturais, geográficas, etc.) e conflitos sociais, como resultado do fortalecimento de fronteiras permeáveis. Dentro desse quadro, a diversidade está no centro dos encontros entre pessoas e é realizada como uma exposição sublime da ideologia oficial, que atua no mainstream socioeconómico. Os diferentes tipos de áreas de conurbação produzem espaços físicos não identificados e não identificáveis (Harvey, 2012) promovendo, entre outras, comunidades locais costeiras subjugadas pela sua invisibilidade socioeconómico e cultural, revelada pela sua invisibilidade intelectual (Mesquita, 2017); as comunidades piscatórias locais inseridas em áreas costeiras urbanas são disto um exemplo.

Estes espaços são organizados em torno de nossa atual entropia e anomia. É aqui que encontramos um espaço, ou melhor, um não-espaço para um certo tipo de conjunto invisível de relações sociais. No não-espaço urbano (Mesquita et al., 2011), essas relações sociais acontecem dentro de um processo naturalizado que caracteriza qualquer sistema hegemónico – como agente da (des)ordem do mundo capital. Paralelamente a este movimento, e também como consequência da Idade Industrial, os seres humanos afetam de forma crescente os Ecossistemas da Terra por meio da conversão do consumo não controlado de recursos (Turner et al., 1991). A contínua ameaça sobre os recursos tem aumentado a conscientização sobre a necessidade de adotar abordagens de gestão mais holísticas e ecossistemicas (Boyd & Foke, 2012), nas quais a dimensão humana não é esquecida (Restivo, 1994) e a dimensão educacional crítica, complexa e sistémica (Barata & Ambrósio, 1988) torna-se fundamental. Neste contexto,  as abordagens de investigação bio-epistemológicas e integrais requerem uma concepção e um processo  bottom-up.

Neste sentido surge o Observatório de Literacia Oceânica – OLO, um espaço trans-académico desenvolvido através de um movimento ascendente e transversal de cidadãos oriundos de diferentes grupos da sociedade, com grande diversidade intelectual, extremamente atentos ao movimento de conurbação urbana que os cerca e previamente conectados via projetos nacionais, nomeadamente: (a) GEPEM Pt: Grupo de Estudos e Pesquisa em Etnomatemática de Portugal, conectado diretamente com o GEPEm matriz, sediado no Departamento de Educação da Universidade de São Paulo / Brasil; (b) D.A.R. à Costa Tr@nsFormArte 2009: projeto subsidiado pelo Programa Escolhas, o qual foi promovido pela Presidência do Conselho de Ministros e integrado no Alto Comissariado para as Migrações / Portugal; (c) Projeto Fronteiras Urbanas – a dinâmica dos encontros culturais na Educação Comunitária: subsidiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia / Portugal; e (d) Political Flow in the Communitarian Education: Topological Ontology in the Urban Boundaries: também subsidiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia e pelo qual este grupo se veio a desenvolver. 

O OLO assume-se como uma nova postura transdisciplinar e transcultural dentro do campo da investigação, na qual os membros das comunidades locais costeiras, para além da comunidade científica clássica, são participantes ativos críticos. Esta postura reconhece que:

  • Os seres humanos são componentes dos ecossistemas (Pickett et al., 2008);

  • Interações entre decisões políticas e de gestão locais com os processos ecológicos em escala local podem causar mudanças pró-ativas ambientais em grande escala (Alberti, 2005).

  • A simbiose entre conhecimento tradicional, local, técnico e científico é uma importante ferramenta educativa emancipatória (Mesquita, 2011);

  • As vozes das comunidades locais costeiras devem ser consideradas na tomada de decisão política e de gestão locais (Vasconcelos et al., 2012); 

OLO é um espaço científico, diferenciado do habitual, integrado no grupo  de investigação Estuários e Zonas Costeiras do MARE Centre, onde a comunidade académica/científica é constituída pela parte da não-parte (Rancière, 1995) da sociedade – uma inovação no âmbito da investigação.  Neste espaço, o trabalho caminha par e passo com a sociedade civil na busca de alternativas aos modelos atuais do desenvolvimento humano costeiro. Isto visa a construção conjunta e crítica da inteligência coletiva local. A relação transdisciplinar e o encontro da diversidade apresentam-se como alicerce do OLO via uma equipe multidiversa de investigação que trabalha com uma perspetiva integral (Acosta, 2016) e holística (D’Ambrosio, 2001). Foca-se em abrir um novo potencial para a participação ativa crítica e o empowerment dos membros das comunidades costeiras privilegiando os instrumentos intelectuais. Explora-se, assim,  o encontro da diversidade para re-significar, coletivamente, o papel da comunidade académica/científica na sociedade e incentivar a participação comunitária na gestão de recursos através de um processo dialógico inserido na educação comunitária local.